Carta de Sigmund Freud a Chaim Koffler

19 de outubro de 2023by Ato Freudiano0
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A carta de Sigmund Freud dirigida a Chaim Koffler, membro da Fundação para a Reinstalação dos Judeus na Palestina (Keren Hayesod), data de 26 de fevereiro de 1930 e foi traduzida pela primeira vez do alemão ao francês por Jacques Le Rider. Foi publicada pela revista “Cliniques méditérranéennes” (n° 70, Erès, 2004), acompanhada por um comentário de Elisabeth Roudinesco, historiadora da psicanálise.

Viena, 19 Berggasse, 26 de fevereiro de 1930

Senhor Doutor,


Não posso fazer o que o senhor deseja. Minha dificuldade em despertar o interesse do público por minha personalidade é impossível de superar e as circunstâncias críticas atuais não me parecem favorecer essa empreitada. Quem quer influenciar o maior número de pessoas deve ter algo de empolgante a dizer, e isso meu julgamento pouco entusiasmado pelo sionismo não me permite. Tenho com certeza os melhores sentimentos de simpatia pelos esforços consentidos livremente, sinto-me orgulhoso pela nossa universidade de Jerusalém e me regozijo da prosperidade dos estabelecimentos dos nossos colonos.

Mas, por outro lado, não penso que a Palestina possa vir a tornar-se um Estado judaico nem que o mundo cristão, como o mundo islâmico, possam um dia estar dispostos a confiar seus lugares santos aos cuidados dos judeus. Me pareceria mais sensato fundar uma pátria judaica sobre um solo não conotado historicamente; decerto sei que, para um objetivo tão racional, jamais seria possível suscitar a exaltação das massas nem a cooperação dos ricos. Admito também, com pesar, que o fanatismo irrealista de nossos compatriotas tenha sua parte de responsabilidade no despertar da desconfiança dos árabes. Não posso ter a mínima simpatia por uma piedade mal interpretada que faz de um pedaço do muro de Herodes uma relíquia nacional e, por causa dela, desafie os sentimentos dos habitantes da região.

Julgue o senhor mesmo se, com um ponto de vista tão crítico, eu posso ser a pessoa certa para fazer o papel de consolador de um povo perturbado por uma esperança injustificada.

Freud

Tradução: Leneide Duarte-Plon


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